quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Ifá em preto e branco.


Autor: Ifagbaiyin Agboola.

Quando um escritor se dispõe a abordar assuntos polêmicos há que estar preparado para interpretações equivocadas e críticas que venham a questionar sua atitude. 

Esse texto não tem a intenção de analisar questões sobre racismo, preconceitos ou etnias.

Há mais de meio século faço parte da religião dos Òrìsàs e durante esse período tenho ouvido inúmeras vezes pessoas dizerem que o culto ao Òrìsà não é lugar para brancos. Um dos argumentos para tal constatação é que estes não tem ritmo e que, portanto, não pertencem a esse meio.

Ainda que a intenção desse texto não seja analisar questões racistas, se faz necessário lembrar que o racismo consiste em ideias preconcebidas e discriminação com base em percepções sociais e não em constatações fixas sobre determinado comportamento ou costume. Haja vista que ritmo e dança são somente algumas das atividades de nossa religião, seria preconceituoso definir que brancos não dispõe da capacidade de internalizar o ritmo que, supostamente, segundo pessoas que sustentam tal argumento, seria de domínio de algumas etnias. Ao contrário de ver uma atitude que busque desmistificar esse conceito, vejo cada vez mais discursos de cunho político intensificando essa ideia que considero racista.

É comum perceber em alguns discursos a intenção política, enfatizando e exaltando a beleza de uma etnia, buscando nos despreparados o apoio para o beneficio individual sacrificando o coletivo.

Não há que se investigar muito para perceber o equivoco histórico, separatista e ignorante, uma vez que quase tudo que é categorizado como negativo, leva adjetivos como negro: magia negra, humor negro, peste negra.

Há um ano e meio mudamos para a Bahia e ainda estamos tentando entender as relações interpessoais num estado cuja a maioria da  população, é influenciada pela cultura yoruba.

Outro dia fui testemunha, dentro de minha casa, do depoimento de um membro de nossa família ao descrever o dia que nos conheceu:

“Eu estava tão ansioso para consultar (o oráculo) naquele dia que nem fui trabalhar, mas quando cheguei naquela casa e vi um casal de brancos, frustrei todas as minhas expectativas.”

Há alguns meses atrás, conversando com um outro iniciado em nossa casa, comentei com ele que os preços praticados na feira de São Joaquim, em Salvador, eram bastante elevados para o material da nossa religião.

Ele me respondeu:

“Também o senhor branco desse jeito com esse seu carrão branco, queria o que?”

Deixei de fazer as compras nessa feira, pois entendi que por ser branco os preços a pagar seriam sempre diferentes dos cobrados de moradores locais, para materiais usados à prática da mesma religião. 

Quando nos deparamos com fatos como esses, entre tantos outros, fica difícil entender os discursos de alguns intelectuais que insistem em dizer que o Brasil é o país do futuro e que temos em nossa gente o exemplo de uma miscigenação que deu certo.

O que será que eles querem dizer com isso?

Sou iniciado em Ifá e estudo diariamente os versos que constituem os pilares de nossa religião e curiosamente não encontrei nada que se refira à cor de pele em nossas escrituras.

Pessoalmente acredito que a religião tradicional yorùbá tem uma grande capacidade de transformar o ser humano. Ifá fala sobre conceitos que facilitam a convivência e minimizam a brutalidade da vida moderna, mas as questões relacionadas a traumas sociológicos deveriam ser uma preocupação de todos nós e principalmente do nosso governo.

Infelizmente o que vejo, ao longo desses anos, são politicas equivocadas que estimulam a preguiça mental e a falta de aceitação às diversidades.



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