Ifá em preto e branco.
Autor: Ifagbaiyin Agboola.
Quando um
escritor se dispõe a abordar assuntos polêmicos há que estar preparado para
interpretações equivocadas e críticas que venham a questionar sua atitude.
Esse texto
não tem a intenção de analisar questões sobre racismo, preconceitos ou etnias.
Há mais de
meio século faço parte da religião dos Òrìsàs e durante esse período tenho
ouvido inúmeras vezes pessoas dizerem que o culto ao Òrìsà não é lugar para
brancos. Um dos argumentos para tal constatação é que estes não tem ritmo e
que, portanto, não pertencem a esse meio.
Ainda que a
intenção desse texto não seja analisar questões racistas, se faz necessário
lembrar que o racismo consiste em ideias preconcebidas e discriminação com base
em percepções sociais e não em constatações fixas sobre determinado
comportamento ou costume. Haja vista que ritmo e dança são somente algumas das
atividades de nossa religião, seria preconceituoso definir que brancos não
dispõe da capacidade de internalizar o ritmo que, supostamente, segundo pessoas
que sustentam tal argumento, seria de domínio de algumas etnias. Ao contrário
de ver uma atitude que busque desmistificar esse conceito, vejo cada vez mais
discursos de cunho político intensificando essa ideia que considero racista.
É comum perceber
em alguns discursos a intenção política, enfatizando e exaltando a beleza de
uma etnia, buscando nos despreparados o apoio para o beneficio individual sacrificando
o coletivo.
Não há que
se investigar muito para perceber o equivoco histórico, separatista e
ignorante, uma vez que quase tudo que é categorizado como negativo, leva adjetivos
como negro: magia negra, humor negro,
peste negra.
Há um ano e
meio mudamos para a Bahia e ainda estamos tentando entender as relações
interpessoais num estado cuja a maioria da população, é influenciada pela cultura yoruba.
Outro dia
fui testemunha, dentro de minha casa, do depoimento de um membro de nossa
família ao descrever o dia que nos conheceu:
“Eu estava tão ansioso para consultar
(o oráculo) naquele dia que nem fui trabalhar, mas
quando cheguei naquela casa e vi um casal de brancos, frustrei todas as minhas
expectativas.”
Há alguns
meses atrás, conversando com um outro iniciado em nossa casa, comentei com ele
que os preços praticados na feira de São Joaquim, em Salvador, eram bastante
elevados para o material da nossa religião.
Ele me
respondeu:
“Também o senhor branco desse jeito
com esse seu carrão branco, queria o que?”
Deixei de
fazer as compras nessa feira, pois entendi que por ser branco os preços a pagar
seriam sempre diferentes dos cobrados de moradores locais, para materiais
usados à prática da mesma religião.
Quando nos
deparamos com fatos como esses, entre tantos outros, fica difícil entender os
discursos de alguns intelectuais que insistem em dizer que o Brasil é o país do
futuro e que temos em nossa gente o exemplo de uma miscigenação que deu certo.
O que será
que eles querem dizer com isso?
Sou iniciado
em Ifá e estudo diariamente os versos que constituem os pilares de nossa
religião e curiosamente não encontrei nada que se refira à cor de pele em
nossas escrituras.
Pessoalmente
acredito que a religião tradicional yorùbá tem uma grande capacidade de transformar
o ser humano. Ifá fala sobre conceitos que facilitam a convivência e minimizam
a brutalidade da vida moderna, mas as questões relacionadas a traumas
sociológicos deveriam ser uma preocupação de todos nós e principalmente do
nosso governo.
Infelizmente
o que vejo, ao longo desses anos, são politicas equivocadas que estimulam a
preguiça mental e a falta de aceitação às diversidades.
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